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Os fundos e as eleições

Os fundos e as eleições

Artigo de Opinião de José Manuel Fernandes, Deputado ao Parlamento Europeu

António Costa tem cerca de 23 milhões de euros por dia de fundos europeus até 2027. Nunca um Governo teve tanto dinheiro à sua disposição. Este enorme envelope financeiro deveria ser investido para conseguirmos um Portugal competitivo, empreendedor, moderno e coeso do ponto de vista social e territorial. Para além dos enormes recursos financeiros, o nosso país tem um povo trabalhador, bons empresários, excelentes escolas e universidades, instituições notáveis na área social. A nossa gastronomia, o nosso património, o mar, os rios, a nossa natureza são bênçãos. Temos tudo para triunfar e alcançar um futuro de qualidade e sucesso para cada Português.

A avalanche de fundos europeus está a servir para disfarçar o nosso fraco crescimento económico e a má governação socialista, mas não está a preparar Portugal para vencer no mundo global. A prova é que estamos a ficar na cauda da Europa em termos de crescimento económico. Depois da queda de 7,6% em 2020, a Comissão Europeia estima que Portugal cresça apenas 3,9% em 2021: menos do que a média europeia (4,8%) e francamente abaixo de países como a Irlanda (7,2%) ou a Roménia (7,4%).

Infelizmente, não temos um Governo à altura dos Portugueses e dos desafios que enfrentamos. O PS não prepara o futuro, não tem estratégia, não define objetivos, não envolve o território, não moderniza as instituições, não descentraliza, não acredita na iniciativa privada, não promove o rigor e a competência.

Estamos em setembro de 2021. Sabem que ainda não está aprovado o Portugal 2030, que terá mais de 30 mil milhões de euros a preços correntes?

A economia precisa destes recursos, mas António Costa vai adiando sempre com os olhos no calendário eleitoral. O Governo ainda está a negociar com a Comissão Europeia, mas não ouviu as regiões, os autarcas, os empresários, as universidades. Estes fundos servem para diminuir as disparidades regionais. É evidente que se os usarmos nas regiões mais ricas, o que acontece é que aumentam essas mesmas disparidades. Por isso, tenho insistido que será inaceitável o Norte receber menos dinheiro do que os 3.400 milhões de euros que tivemos no Portugal 2020. Lembro que o Norte é a região de Portugal com menos PIB per capita.

Trabalhei arduamente nas negociações dos fundos europeus. Por isso, é com particular frustração e preocupação que vejo atrasos e uma má distribuição desses fundos. Defendo os seguintes princípios básicos: as regiões que mais precisam devem ser mais apoiadas; os investimentos devem criar emprego de qualidade; as empresas são essenciais para criarem riqueza; há que aumentar as exportações e reduzir as importações; há que reforçar a competitividade da economia. Infelizmente, o Governo socialista não gosta da iniciativa privada e só governa para os locais onde há muitos votos.

Assisto a um Portugal adiado e anestesiado. O PS não é bom a governar, mas é excelente na propaganda e na criação de “narrativas”. Veja-se o Congresso da semana passada, que serviu para António Costa apresentar medidas do Governo! A impunidade é de tal ordem que assistimos a candidatos socialistas às câmaras municipais a dizerem: “Votem em mim porque, sendo eu socialista, o Governo apoia mais facilmente”. É o descaramento total.

Como se não bastasse, as medidas anunciadas por António Costa no Congresso são repetidas ou simplesmente plagiadas. Em novembro de 2020, o PS chumbou a proposta de alargamento do programa IRS Jovem, apresentada pelo PSD, na Assembleia da República. Mas só para agora a vir copiar e apresentar como sua, em vésperas das eleições autárquicas.

Outras medidas anunciadas pelo primeiro-ministro são uma mera reciclagem de anúncios do passado. O prolongamento do Programa Regressar, que o primeiro-ministro apresentou como novidade, está previsto desde dezembro de 2020. O Governo, por demorar a legislar, tem o descaramento de apresentar a mesma proposta duas vezes...

Enfim, António Costa veio anunciar apoios à natalidade e à infância. Mas estas ajudas resultam do Fundo Social Europeu e da Garantia europeia para a Infância. A apresentação destas medidas sem o envolvimento das partes interessadas, designadamente sem os municípios e as freguesias, é aliás contrária à recomendação de Bruxelas. Mesmo na sua "convenção eleitoral autárquica" travestida de Congresso, o PS desrespeita as autarquias.

Nos últimos 25 anos, o PS governou 18. Os socialistas instrumentalizaram os fundos europeus, não para desenvolver o país, mas em proveito próprio, ao sabor das eleições. As autárquicas que se avizinham provam que, com António Costa, a receita não mudou. Para o primeiro-ministro, o país é o PS; e o calendário dos fundos é o calendário eleitoral.

O futuro de Portugal merece uma utilização mais eficaz dos fundos. Merece uma forma mais democrática de encarar as eleições.